terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Desconhecimento ou desonestidade intelectual?

Existe um ditado popular que expressa muito bem o papel da oposição e de setores da mídia no Brasil, sobretudo em ano eleitoral – “tem gente que fala demais por não ter nada a dizer”. Não tendo uma pauta coerente de pontos passíveis de crítica ao governo Lula, setores conservadores da sociedade brasileira passam a propagar um discurso falacioso, impregnado pela velha fórmula de tentar disseminar o “medo” na população.

Desde o início de fevereiro, têm sido recorrentes nas páginas de diversos jornais do país notícias que dão a entender que “o programa de governo de Dilma (pré-candidata do PT à sucessão presidencial) é estatizante” e que “Dilma defende o Estado interventor na economia”. Alguns, ecoando as vozes da oposição desesperada, vão além, dizendo que “Dilma defende o Estado autoritário”.

Lembremo-nos que essas mesmas vozes que hoje, levianamente, dizem que Dilma defende o Estado autoritário e interventor, são as mesmas vozes que nos anos 90, quando chegaram ao poder, defenderam a implantação do Estado Mínimo, reproduzindo no Brasil o ideal da Terceira Via. Colocando em prática os ensinamentos de teóricos como Robert Nozick e Guy Sorman, os demo-tucanos iniciaram um processo de desmonte do Estado brasileiro.

Agora, comparemos: o Estado Mínimo, tão defendido pelos demo-tucanos e certos setores da imprensa brasileira, levou o Brasil a um processo vergonhoso de privatizações, onde setores estratégicos do país passaram às mãos da iniciativa privada a preço de banana. Não bastasse a onda de privatizações, o governo FHC esvaziou a importância dos bancos públicos, pretendendo coloca-los, caso houvesse tempo hábil, também na lista da privatização.

1º mito: Estado Forte é o mesmo que Estado Máximo
Ora, o governo Lula, ao qual muitos acusam de seguir a mesma política econômica de FHC, foi exatamente nesta contramão. Em primeiro lugar, rompeu-se com o neoliberalismo e com o mito de que o mercado, por si só, regula a economia. Decretou-se o fim dessa falácia teórica conhecida como Estado Mínimo. Cessaram-se as privatizações e ao mesmo tempo fortaleceu-se o papel do setor público como indutor e regulador do mercado.

Ou seja, estabeleceu-se um conceito de Estado Forte, capaz de induzir, por meio de parcerias com o setor privado, o investimento no país. E não é demais lembrar que, enquanto o resto do mundo amargava os efeitos da crise financeira do capitalismo, o Brasil mantinha-se forte: graças à atuação do Estado.

Para se ter uma idéia, enquanto no governo FHC o volume de créditos da Caixa Econômica Federal era de R$ 5 bilhões, em 2009, no governo Lula, houve um salto para R$ 45 bilhões. O BNDES, por sua vez, tinha um limite de financiamento no governo FHC de R$ 40 bilhões. Em 2009, o banco de fomento emprestou R$ 130 bilhões ao setor produtivo brasileiro.

Seria este um caso de Estado Máximo? Naturalmente, não. Segundo a literatura, Estado Máximo é aquele que controla toda a economia e interfere nas liberdades individuais – é, por que não dizer, uma forma de Estado autoritário. O que vimos ao longo desses últimos 8 anos foi um Estado mais presente sim, mas que em nenhum momento ameaçou intervir nas liberdades dos cidadãos brasileiros.

2º mito: Estado Forte é ineficiente economicamente
Entre os defensores do Estado Mínimo, há os que argumentam que qualquer interferência do Estado na economia provoca distorções, levando à ineficiência dos mercados. Esse foi um argumento amplamente apresentado pelos que defendiam as privatizações ao longo do governo FHC, tendo persistido até hoje nos meios conservadores.

A verdade é que exatamente o oposto: é a ausência do Estado que leva os mercados às imperfeições. Se não houver um mercado regulador, por exemplo, criam-se brechas para o fim da livre concorrência e o surgimento de monopólios ou oligopólios. Qualquer iniciante no estudo de Economia sabe que concorrência imperfeita é o maior exemplo de ineficiência da economia.

Além disso, quando o Estado adota uma postura de indutor do investimento, ele potencializa o setor privado, garantindo um maior crescimento econômico. A lógica é bem simples: se o Estado desenvolve uma política industrial que favoreça ao mesmo tempo o consumo das famílias e a produção das firmas, então o setor empresarial passará a investir mais em novas tecnologias, em contratações, criando, assim, um círculo virtuoso.


3º mito: Estado Forte é desculpa para aparelhamento
Um pouco na linha do segundo mito, os entusiastas do Estado Mínimo apregoam que quando o setor público amplia sua presença na economia, então cria-se um cenário de aparelhamento do Estado e inchaço da máquina. Mais uma falácia dos setores conservadores, que ao defenderam um Estado Mínimo querem também minimizar o número de professores, de médicos, de enfermeiros etc, pois acreditam que novas contratações poderiam causar “ineficiência” na economia.

Para se ter uma idéia, quando falamos de cargos comissionados, a relação no caso do governo federal é de 11 cargos comissionados para cada 100 mil habitantes. No caso do governo do Estado de São Paulo, defensor do Estado Mínimo, é de 31 cargos a cada 100 mil habitantes. E na Prefeitura de São Paulo, a relação chega a 45 cargos para cada 100 mil habitantes. Quem mesmo está inchando a máquina?


Percebe-se, dessa maneira, que Dilma, ao prosseguir o projeto iniciado com Lula, reafirma sim um papel do Estado Forte e não do Estado máximo ou do Estado autoritário, como muitos erroneamente gostam de afirmar. Erro esse que pode ser atribuído a duas causas: ou seus entusiastas são iletrados ou são intelectualmente desonestos.

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