sexta-feira, 18 de junho de 2010

Censura nunca mais!

Assis Chateaubriand, dono de uma personalidade um tanto quanto polêmica, disse certa vez uma frase que se tornou escudo da luta pela liberdade de expressão: “minha caneta é meu fuzil”. Censurar o direito de livre expressão é uma das táticas de manutenção do poder mais antigas que se tem na História: desde a formação das primeiras civilizações, no Oriente Próximo, grupos políticos e sociais têm feito uso da “mordaça” para calar a boca de adversários e impedir que a sociedade em geral tenha acesso a informações e opiniões que representam contrapontos às ações gerais desses grupos.

Foi assim nas primeiras civilizações, na Europa feudal, nas monarquias absolutistas, na era dos Grandes Impérios e também na era das grandes ditaduras, inclusive na brasileira, entre 1964 e 1985. A conquista da democracia foi, neste sentido, uma luta também pela liberdade de expressão e não somente pelo direito ao voto. Contudo, é interessante notar que alguns grupos políticos desenvolvem um discurso dúbio: defendem, em tese, as liberdades democráticas, mas em suas ações corriqueiras exemplificam o que há de mais podre em se tratando de censura à livre expressão.

Quando o governo Lula, em dezembro do ano passado, propôs um mecanismo de controle social da imprensa, para garantir tão somente que a mídia se comprometesse em zelar pela prática dos direitos humanos, os setores da oposição brasileira logo reagiram. Das grandes redações ao famigerado Instituto Millenium, todos bradavam contra a suposta “intervenção do Estado” na liberdade do cidadão e da imprensa manifestar suas convicções e opiniões. Aproveitaram-se disso para acusar o governo Lula de censor, para dizer falaciosamente que o governo estava querendo tolher a liberdade de imprensa e por aí a fora. Para pôr fim à polêmica, retirou-se do Plano Nacional dos Direitos Humanos o tal “controle social da imprensa”.

O TSE e a “caça às bruxas”
Iniciado o período eleitoral, contudo, esse mesmo grupo político – a saber, a grande imprensa e setores da oposição – que vociferaram contra o “controle social da imprensa” foram os primeiros a começarem um processo de perseguição e denúncias de sites e blogs que eles classificavam de “propaganda eleitoral antecipada”. Naturalmente, todos os sites e blogs denunciados não faziam apologia à candidatura do tucano José Serra, mas sim da petista Dilma Rousseff. E a coisa chegou ao ponto de nesta semana o TSE determinar que o Google suspenda dois blogs que estariam fazendo “propaganda antecipada” para o PT: o blog da Dilma Presidente e o Blog Os Amigos do Presidente Lula.

Ora, qual o conceito de propaganda antecipada? Acaso expor a sua opinião sobre um determinado candidato, salientando as críticas ao seu projeto político, é fazer propaganda antecipada? Comparar dois projetos políticos distintos e radicalmente opostos e se posicionar em defesa de um é fazer propaganda antecipada? Informar a sociedade sobre avanços conquistados por um governo e que são recorrentemente escondidos pela “grande imprensa” é fazer propaganda antecipada? Desmascarar baixarias e farsas criadas por uma oposição desesperada – e despreparada, é bom que se diga – é, por acaso, fazer propaganda antecipada? Ao que tudo indica, para os juízes do TSE é sim, lamentavelmente.

O interessante é que a grande imprensa, esta sim pode escrever editoriais cheios de bravatas contra o governo, deixando escapar nas entrelinhas a sua preferência política. A grande imprensa defendida pelo Instituto Millenium pode colocar em xeque a idoneidade de pessoas e de partidos políticos, sobretudo se estes não forem de seu agrado. E o TSE não se pronuncia. Revistas e jornais podem criar farsas e denunciá-las, ostentando pseudo-escândalos, sem que haja necessidade de provas concretas: basta usar expressões como “nossa equipe apurou” ou “fontes nos informaram” que está tudo certo. A Justiça Eleitoral faz vista grossa.

Um cineasta pode se passar por comentarista político e todas as noites criticar na TV o presidente Lula e o seu governo, chamando-os de “corruptos”, e isso não é propaganda antecipada. Ora, qual a diferença entre um blogueiro que escreve sua opinião e crítica a um candidato e o cineasta (pseudo-comentarista político) que ladra contra o governo Lula? Uma pessoa com o mínimo de honestidade intelectual dirá que nenhuma, exceto o fato deles estarem em lados políticos opostos. Para o TSE existe toda a diferença: enquanto o cineasta metido a comentarista político emite sua opinião, o blogueiro faz campanha. E assim caminha a democracia que premia a hipocrisia.

Premia a hipocrisia porque quando se assume o lado que se está o sujeito faz propaganda política. Agora, se não se assume, se faz propaganda descarada, mas sem se posicionar oficialmente por um lado, aí não: neste caso é opinião. É essa a democracia do TSE: a democracia da hipocrisia, que dá prêmio aos cínicos e que tenta calar as vozes da honestidade e da razão. Tentativa vã a do TSE e da oposição: como dizia um jingle da campanha presidencial de 2006: “não adianta tentarem me calar, nunca ninguém vai abafar a minha voz, quando o povo quer, ninguém domina”. E ninguém vai dominar a voz do povo.

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