quarta-feira, 10 de novembro de 2010

O ENEM e os diferentes pesos e medidas da grande imprensa

Se um extraterrestre, que nunca teve nenhum tipo de informação sobre a Terra e, muito menos, sobre o Brasil, chegasse nestes últimos dias ao nosso país e tentasse obter informações através dos nossos grandes jornais e emissoras de TV, certamente seria mais um dos que engrossam o coro de críticas ao ENEM – o Exame Nacional do Ensino Médio. Isto porque a grande imprensa tem feito sistematicamente nos últimos tempos um exercício de desconstrução do Exame, que além de ser um poderoso instrumento de avaliação do ensino médio, ainda serve como caminho para milhares de estudantes ingressarem em uma IES (Instituição de Ensino Superior).

Bastou uma falha de proporção residual no último sábado (dia 6 de novembro), quando foi aplicada a primeira etapa do Exame, para que uma enxurrada de críticas ao ENEM, ao ministro da Educação Fernando Haddad e ao governo Lula tivesse início. Antes de seguir, cabe aqui fazer uma ressalva: este blog não tem nenhum tipo de complacência com erros e falhas, defendendo sempre uma postura crítica às mesmas. Ou seja, o questionamento que se faz aqui ao comportamento da imprensa sobre o episódio do ENEM não se dá em função das críticas às falhas ocorridas no ENEM no último final de semana, mas sim ao super-dimensionamento dado a estas falhas.

Falha atingiu apenas 0,006% das provas
De acordo com informações do MEC (Ministério da Educação), a falha de impressão nos cadernos de questões ocorrida no último sábado atingiu um lote de apenas 21 mil provas, em um universo de 3,5 milhões de estudantes que participaram do ENEM. Se fizermos os cálculos, veremos que o lote com falha corresponde à incrível (!) parcela de 0,006% do total: ou seja, em 99,94% dos casos, os cadernos de questões estavam totalmente corretos. Considerando que boa parte desses cadernos com falhas foram trocados por outros, estes corretos, ainda durante os primeiros minutos da prova, apenas 2 mil estudantes foram prejudicados pelo erro da gráfica.

Refaçamos então os cálculos: foram prejudicados 2 mil estudantes dentro de um universo de 3,5 milhões, correspondendo à cifra de 0,0006%, o que deixa claro o super-dimensionamento da falha que vem sendo praticado por boa parte da imprensa brasileira. É claro que o Ministério da Educação terá que encontrar uma solução para que estes 2 mil estudantes que foram prejudicados na primeira etapa do Exame não sejam mais prejudicados ainda para posterior seleção nas IES. E neste ponto é justo que a imprensa faça a devida cobrança. Por outro lado, transformar uma falha pontual em uma “crise”, como foi apregoado pelo blog do Reinaldo de Azevedo, na revista Veja, é um pouco demais!

Deve-se destacar o quão importante tem sido o aperfeiçoamento do ENEM ao longo dos últimos anos, sobretudo no que diz respeito à democratização do acesso ao ensino superior. Afinal de contas, o Exame Nacional do Ensino Médio é um dos principais critérios utilizados pelo ProUni para concessão de bolsas de estudo a milhares de estudantes de baixa renda, que sem esse auxílio do governo federal não teriam condições de freqüentar uma universidade. Dizer, portanto, que existe uma “crise” no ENEM só pode ser explicado por duas razões: desconhecimento sobre o Exame ou então pura má-fé mesmo! Se formos nos basear nessa lógica – a de transformar pequenas falhas em grandes crises – então a imprensa brasileira está perdida, pois vive numa crise monumental há muito tempo.

Dois pesos, duas medidas
De qualquer forma, essa cobertura oportunista que vem sendo dada pela grande imprensa ao episódio do ENEM nos mostra que o embate dos grandes veículos de comunicação com o governo federal nos próximos anos só tende a aumentar. Engana-se quem pensa que a grande luta com a imprensa golpista foi travada na arena da sucessão presidencial: muito pelo contrário, ao que tudo indica a grande imprensa fará o jogo da oposição de forma contundente ao longo de todo governo Dilma. Veja, Globo, Estadão, Folha e Cia não engoliram a derrota nas urnas que sofreram há 10 dias, o que nos faz pensar que a cobertura descaradamente parcial só tende a aumentar nos próximos anos.

Isso fica muito claro quando essa grande mídia super dimensiona uma pequena falha ocorrida no ENEM e esconde, por exemplo, o escândalo da licitação do metrô de São Paulo, denunciado na última semana do segundo turno das eleições presidenciais. Por que os jornais e revistas não dão ao escândalo de favorecimento nas licitações do metrô de SP o mesmo destaque dado a esta pequena falha ocorrida no ENEM? Sejamos claros: o que é mais importante do ponto de vista jornalístico – uma falha que afeta 0,0006% dos estudantes que prestaram o ENEM ou um esquema denunciado pela própria Folha de São Paulo que teve acesso seis meses antes do anúncio oficial pelo Metrô de SP aos vencedores da licitação para a Linha 5?

Por que é tão recorrente esta prática da grande imprensa de inflar pequenas falhas ocorridas na gestão petista e jogar debaixo do tapete grandes erros ocorridos em governos tucanos? Não se trata de justificar um erro pelo outro, mas sim de dar o devido peso a cada falha. É inadmissível, como dito anteriormente, que uma pequena falha que não atingiu nem 1% dos estudantes que prestaram o ENEM se transforme agora em uma “crise” de proporções homéricas na educação brasileira, como quer fazer parecer a grande imprensa. Longe de querer pedir imparcialidade, o que este blog pede à grande imprensa é o mínimo de coerência.

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